09/12/2020 às 15h37min - Atualizada em 09/12/2020 às 16h20min

Candidaturas negras e jovens no interior da Bahia: avanços e desafios

Quando o assunto é eleição municipal no interior da Bahia, a tática do “olho no olho” é carro-chefe para quem quer sair na frente

DINO


A política interiorana é marcada por grandes desafios, dentre elas o racismo, sexismo e a ausência de investimentos, principalmente nas candidaturas de jovens negros (as).

As disputas eleitorais nas grandes capitais são sempre marcadas por grandes planejamentos, gestão de redes sociais, propagandas e muitas estratégias de mídia. Mas quando o assunto é eleição municipal no interior da Bahia, a tática do "olho no olho" é carro-chefe para quem quer sair na frente, porém o jovem negro (a), sem herança familiar política e sem investimento do partido na sua campanha, tem essas dificuldades multiplicadas. É o que traz a matéria de Michele Menezes, jovem comunicadora para a campanha #QueroMeVerNoPoder nas Eleições 2020.

Apesar de ter muito a se comemorar pelo aumento de 2,08% das candidaturas negras em relação ao último pleito de 2016 (TSE), que também é fruto de uma política de ações afirmativas que se constitui há quase 18 anos, ainda há muito o que se debater e ser priorizado dentro dos partidos quando o assunto é raça, gênero e classe. Para Alenilson Santos (PCdoB-BA), 24 anos, comunicólogo, ainda há muito o que se fazer: "As estruturas partidárias não favorecem nossa cor e nem nosso debate propositivo. Elas só favorecem a quem tem recursos e as classes dominantes". Alenilson é egresso cotista da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), militante do movimento negro e de causas de estudantes, filho de marisqueira e de um agricultor e o primeiro da família a concluir o ensino superior em uma universidade pública, reside e atua em Ituberá, território do Baixo Sul da Bahia, 218 km de Salvador.

Apesar de a maioria do eleitorado brasileiro ser negra, a ausência de representação e debate nas câmaras municipais ainda é muito alta. Izabela Lima (PT-BA), 30 anos, fonoaudióloga, entende que a participação das mulheres negras periféricas nos espaços de poder é urgente e possível: "A branquitude e o machismo predominante no poder não nos representa. Sempre estivemos na base, agora queremos nos representar e estamos chegando forte". Izabela é sertaneja, egressa da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), militante e ativista do SUS e do movimento de mulheres negras, reside e atua em Conceição do Coité, território Sisal da Bahia, 168 km de Salvador.

Se lançar enquanto nome de liderança política é desafiador nas eleições municipais interioranas - a ausência de representação de jovens negros nos municípios é nítida e preocupante. Para muitos a inserção de jovens periféricos na corrida eleitoral gera desconfiança e incredibilidade, justamente por essa ser uma estratégia do racismo: ter somente uma única face com cor, sexo, idade e debate. Alenilson apresenta as dificuldades de fazer política sendo jovem negro. Para ele a população não está acostumada a ver debates mais incisivos e responsáveis vindos da juventude: "Não somos a ‘turma agitação’, somos a ‘turma’ que pensa e articula. Somos lideranças políticas".
Para as jovens negras, além das dificuldades impostas e do racismo, o machismo também é uma grande barreira na luta pela democracia. "As pessoas se assustaram ao me ver candidata. Me chamavam de ousada, metida", conta Izabela Lima.

Estrutura e representação

Com a pandemia de COVID-19, o ano de 2020 foi extremamente atípico para a política "corpo a corpo". Aquele famoso cafezinho em cada casa que a(o) candidata(o) tomava, foi mais tímido e mais rápido, bem como o poder de convencimento. Mas, para tal feito, ter estrutura financeira é fundamental. Transporte, alimentação, e outras atividades de campanha exigem disposição, disponibilidade e muito recurso.

Para Alenilson Santos, as estratégias de redes sociais foram uma alternativa importante, mas em Ituberá, Baixo Sul, as redes sociais não são vistas como fonte e espaço formativo de política. O contato presencial é fundamental, mas para quem tem condições de fazê-lo: "A gente precisa montar estratégias para se autofinanciar. Quando olhamos para as candidaturas negras ou LGBTQIs percebemos que não conseguem sentir o mesmo aporte financeiro que é feito com e para os brancos."

Já para Izabela Lima, em Conceição do Coité, semiárido baiano, além do acesso à internet ser precário, as mídias locais são ligadas a partidos e grandes empresários que há anos financiam os mesmos grupos. "Mesmo com todos esses desafios, hoje meninas olham para mim e me veem como inspiração. Em 2024 seremos mais fortes", declara Izabela.

Apesar dos 338 km de distância de uma cidade para a outra, a luta pelo racismo e a ânsia por serem suas próprias representações, unem Alenilson e Izabela. Alenilson Santos obteve 162 votos e não foi eleito. Izabela Lima obteve 498 votos e não foi eleita.

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